Recentemente, um vídeo de uma cantora fazendo uma manobra vocal
“sobre-humana” invadiu as redes sociais. Trata-se de Anna-Maria Hefele mostrando uma habilidade e controle incríveis dos harmônicos da
voz para emitir 2 notas ao mesmo.
Também ao mesmo tempo, surgiram reportagens dizendo que emitir
2 notas simultâneas seria algo “extremamente raro”, um “talento para poucos”, e
aquela besteira sensacionalista que estamos acostumados, e que combato sempre
aqui no blog.
Alguns acham que ela utiliza 2 fontes sonoras, outros que
ela faz algo quase que digno dos x-men, mas, afinal de contas, como é possível
alguém emitir 2 notas? Será que a cantora do vídeo é um fenômeno raro? De onde
surgiu essa prática?
Quem leu meus textos sobre acústica e trato vocal (consulte
no índice ao lado) já sacou que não há nada de extra-terrestre na Anna-Maria,
exceto pelo seu domínio incrível de manipular diferentemente esses sons, que
chamamos de sobretons.
Retomando e resumindo o tema: Quando o ar passa pelas pregas
vocais, a vibração da mucosa dessas pregas gera uma nota fundamental, que é
aquela que queremos cantar, e somado, gera uma série de outras notas. No nosso
trato vocal, essas frequências emitidas serão abafadas ou amplificadas e quando
ouvidas em conjunto formarão o timbre, o tipo de som, aquilo que
diferencia a sua voz da do seu vizinho, de uma chaleira, de um colibri, de um
violino, e tudo mais no planeta. Ou seja, quando cantamos uma nota, cantamos uma
infinidade delas, os harmônicos, e inconscientemente selecionamos alguns para criar sons culturalmente compreensíveis.
Aí entra a técnica do overtone. Com alguns movimentos do
trato vocal (língua, lábios, palato, etc.) somos capazes de abafar mais ainda
alguns harmônicos e amplificar incrivelmente outros (através dos formantes), fazendo com que eles se
destaquem e apareçam como uma nova nota somada à primeira, a fundamental. O
canto de overtones, ou canto harmônico, ou difônico, nada mais é que cantar uma
nota e posicionar o trato vocal para que ele mostre outra nota junto.
Apresento Miroslav Grosser, um alemão que tem uma série de vídeo aulas sobre o tema, é muito fácil reproduzir overtones, até não contores conseguem fazer facilemente. Mas calma, ter o controle da Anna-Maria já é algo bem mais complexo e exige um trainamento muito mais refinado.
Siga os passos do Miroslav no video a seguir e divirta-se. O mais fácil que ele fala é transitar lentamente entre as vogais I e U, tentando ouvir os harmônicos saltando.
Essa prática não surgiu agora, ela é milenar, e encontrada
em países como Mongólia, Tuva (uma região da Sibéria), Tibet, Cazaquistão,
Turcomenistão. Atualmente é muito fácil encontrar artistas desses países no
youtube, e vou deixar aqui uma seleção bastante interessante.
Em algumas das técnicas (são várias) existem também a vibração das pregas vestibulares (lembra dos drives?) e o som sai ainda mais esquisito, para nós ocidentais.
Miroslav Grosser destruindo:
O grupo Huun Huur Tu:
De Tuva:
Rock mongol com overtone:
Techno com overtone:
Lembre-se, voz é moldável, se você quer fazer, basta treinar
da forma correta.
Pra quem se interessar, aqui está um artigo completo sobre a técnica dos cantores de Tuva, é fantástico:
https://math.dartmouth.edu/archive/m5f10/public_html/Levin1999SciAm_tuvan_throat_singing.pdf
Pra quem se interessar, aqui está um artigo completo sobre a técnica dos cantores de Tuva, é fantástico:
https://math.dartmouth.edu/archive/m5f10/public_html/Levin1999SciAm_tuvan_throat_singing.pdf
Que incrível!!!! Achei lindo isso!!!
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